quinta-feira, 14 de maio de 2015

Como me tornei uma mulher e feminista


Quase minha vida toda eu admirei homens, homens do gênero masculino, digo. Os meus cantores favoritos eram homens, os escritores e poetas também homens, bem como atores e a maioria dos meus amigos sempre foram homens.
Quando era pequena e não gostava de brincar de boneca e casinha, vestia-me com “roupas de menino” e um boné na cabeça para jogar futebol na rua, subir na árvore, andar de bicicleta, jogar bete com meus amigos “homens”.
Minhas referências femininas sempre foram mulheres fortes: minha mãe: mandona e incisiva; minha avó materna: de aparência fria, trabalhadora e independente, uma fortaleza; minha avó paterna: corajosa e senhora de suas próprias convicções e vontades. Porém... Sempre houve um porém que eu nunca soube qual era.
O fato é que eu sempre achei os garotos mais legais e eu me sentia mais a vontade com eles. Houve um caso em que chegaram a insinuar que eu era homossexual (como se isso fosse uma monstruosidade), mas no momento eu estava mais preocupada em escolher um adesivo bacana de carrinhos....
Na adolescência eu comecei a fazer amizade com ambos os sexos com uma facilidade maior, no entanto continuei ser a moleca/estranha da turma. Enquanto minhas amigas estavam se maquiando, emagrecendo e alisando o cabelo, eu colocava meu jeans cuidadosamente rasgado, soltava minha juba “à La Caetano tropicália” e ia feliz com meus muitos quilos acima do peso ideal “conquistar o mundo”.
Eu não conquistei o mundo e tive mil e uma desilusões e minha autoestima foi esmagada pelos padrões de beleza e de comportamento (mas eu tinha algum orgulho na época e fingia que “nada me ofendia”). Ouvi muitas vezes: “ele não gosta de você porque você é gorda”, “você não vai arrumar namorado, prenda essa cabelo”, “você tem que ser mais delicada e se vestir como uma mocinha”.
Curiosamente, sofrendo pelo machismo (eu não sabia o que era isso na época) continuava devota e apaixonada pelos homens. Eu admirava os meus professores e alguma ou nenhuma professora, e quem eu culpava era minha mãe e minha avó pelas palavras que tanto me magoavam. Eu era adolescente e não entendia (por isso a necessidade de chegar às adolescentes) que elas apenas reproduziam o que aprenderam, tão sujeitadas aos padrões quanto o restante do mundo.
Hoje, pensando melhor, acho que minha antiga identificação com o mundo masculino era um simples desejo de ter o que eles tinham/têm (e eu não estou me referindo a um falo, com o freudistas –sim, freudistas e não freudianos- podem supor). O que eu quero dizer é que o meu irmão podia brincar livremente pela rua, correr e se machucar e estava “tudo bem” porque era “coisa de menino”, os rapazes adolescentes podiam chegar casa mais tarde, ficar com várias garotas e até ouvir rock (é, disseram que rock era coisa de moleque) sem serem recriminados, os homens sempre me pareceram mais seguros e donos de si, afinal tinham/têm um espaço no mundo e isso era/é escancarado, defendido e legitimado.

Logo, eu só “queria ser homem” porque eu queria ter voz. Felizmente, em algum momento eu me dei conta que eu não precisava ser isso ou aquilo para ter voz, bastava ser EU para ter a “MINHA” voz. E com um pouquinho mais de tempo, percebi que me identificando com o gênero feminino deveria me juntar e lutar por todas as vozes das pessoas que se identificam também e sofrem com a opressão (na maioria das vezes muito mais perversa do que eu sofri) do patriarcado e do machismo. 

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