Não, não é que eu seja promíscua como ele me disse da
última vez. Teria me chamado puta, mas um "palavrão" em sua boca
seria como um verme em pétalas de rosa. Era doce demais, gentil demais e sem
graça demais para aumentar o tom de voz, soltar sua fúria, xingar... velho!
Mas não vamos nos ater a ele e sim a mim, que é quem
realmente importa. Não sou promíscua, eu só me aceito e não sou hipócrita.
Sou como uma longa língua de serpente que rodeia as mais
sinuosas e minúsculas partes de um corpo, procurando onde cravar as presas e
liberar fluidos. Isso não é maldade, é apenas solidão. Preciso dos outros tanto
quanto o pintor precisa dos girassóis amarelíssimos ainda desfeitos nas cerdas
do pincel. Preciso dos outros tanto
quanto o fogo do absinto precisa da língua. Preciso dos outros tanto quanto as
vozes dos desaparecidos precisam da escuridão para se multiplicar
Nem vulgar eu chego a ser. Sou distante e próxima como uma
visão amanhecida em meio a suor, gemidos e raios de sol que mormaçam o quarto.
Dor ou prazer, não importa, penetrei pela narina e sai pelos poros num suspiro
profundo, num piscar dobrado. Queriam mais e eu também. Efêmera, só intensidade
ofereço e sempre deixo isso bem claro. A promiscuidade permitiria isso? O
esclarecimento dos fatos, o jogo limpo?
Denominem-me do que quiserem: santa, vagabunda, criança, maliciosa,
exótica, culta, estúpida, profana. Sintam o que puderem: amor, desejo, ódio,
compaixão, empatia, tesão. Creiam os senhores, tão sabidos de mim, que eu-não-me-im-por-to. Essa necessidade de
classificação só mostra os quão medíocres os sábios são. Aristóteles que dane
com seus métodos. O bom é ser e sentir e não falar como e para que ser e
sentir.
Amei a todos. Uma pequenina parte de todos: o olhar juvenil
de um, a risadinha forçada do outro, as pequenas falhas da sobrancelha
negríssima, os dedos pontiagudos das
compridas mãos, a boca fina de sorriso caído, as orelhas pequeninas, os pelos
exagerados, a cicatriz na barriga... amei pequenos detalhes, pequenos gestos e
principalmente as pequenas dúvidas de cada homem com quem me relacionei.
Não passo de um momento. Momento em que estive sôfrega na
boca de um, em pé diante do outro, extasiada com os lábios preenchidos,
obediente olhando para o chão, mandando sobre as costas, deslizando na água,
murmurando num ouvido, exalando paixão, em silêncio contemplando o depois.
Sou sincera demais para ser promíscua, sou humana demais
para corresponder suas expectativas de amor platônico e cristão. Sou demais
para vocês.
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